Eles se autodenominam donos de um trecho de 160 metros de área nobre do Campo Grande, em Santos.
Basta a menor menção de que algum condutor vá estacionar nas poucas e disputadíssimas vagas da Rua Amazonas, entre as ruas Espírito Santo e Pedro Américo, para que apareçam.
Num gesto cordial, oferecem com exclusividade um espaço da via, que se entende ser pública. Junto com a recepção amiga ao potencial cliente, vem o pedido: “Vai ao hospital? Posso ficar de olho”. A cordialidade tem um preço. E, caso a resposta seja negativa, todo o bom trato se esvai.
Guardador chega a bloquear parcialmente o trânsito para que motoristas possam parar perto do hospital. Os guardadores de carros – popularmente chamados de flanelinhas – estão nas vias atraídos pelo elevado número de pessoas que circulam pela região do Hospital Ana Costa. Eles aproveitam as escassas vagas próximas à unidade e a outras clínicas médicas do local para faturar.
Embora não exista uma tabela com valores fechados, o pagamento abaixo do esperado pelos serviços pode provocar reação adversa dos flanelinhas. Retaliações são frequentes, conforme afirmam moradores ao entorno. “É um absurdo. Eles loteiam a rua, e a gente fica refém dentro de nossas casas. A rua é realmente deles”, diz uma dona de casa, sob anonimato. “Melhor não dar o nome: moro perto e tenho medo de ser incomodada”, continua.
Esquema
Recentemente, A Tribuna acompanhou a atividade de três flanelinhas na quadra final da Rua Amazonas.O ponto de trabalho é facilmente reconhecido por cadeiras instaladas na calçada e ocupadas por eles. No escritório improvisado e a céu aberto, são distribuídos os espaços pelos quais eles serão responsáveis.
Cada um tem sua clientela. Para não haver confusão na hora de receber por cuidar do carro, diferentes folhas de árvores indicam qual flanelinha está cuidando do veículo. Apesar de rudimentar, o sistema impede eventuais conflitos entre eles.
São prestativos e, assim que um condutor aciona a seta para estacionar, vão longo oferecendo ajuda. Apontam a vaga e indicam a melhor forma de parar no espaço demarcado. Para completar, colocam-se na via, obstruindo o trânsito, a fim de facilitar a baliza do motorista. A rua também é temporariamente interrompida na saída dos veículos.
“Agem como verdadeiros agentes de trânsito. Em breve, vão começar a multar os carros”, ironiza a dona de casa Maria Izabel Bernardes.
Ambulantes próximos ao local afirmam observar constantes abusos por parte dos flanelinhas nas redondezas.
“São velhos conhecidos da rua, não há quem não os conheça. Recusar-se a pagar é pior”, diz um comerciante, também sem se identificar.
Lixão
Para moradores, a situação da via remete a um estado preocupante.
“A impressão é a de que moro em um verdadeiro lixão. O cheiro de urina é insuportável”, relata um morador, igualmente sob anonimato.
Outro vizinho, que também não quer ter sua identidade revelada, sustenta que há uso de entorpecentes a qualquer hora do dia.
“Eles passam o dia inteiro consumindo drogas, bebendo e alguns se aproveitam da situação para roubar os carros”, cita.
Poucas vagas
É praticamente impossível estacionar no trecho sem que os guardadores exijam dinheiro para que o veículo possa permanecer na vaga pública. Além do constrangimento, o condutor precisa ter paciência a fim de negociar o menor valor.
“Dou alguns trocados assim que estou quase indo. Como já estou com o motor (do carro) ligado, fica mais fácil ir”, ensina o pensionista João Franco.
Quem não quer pagar pela vaga precisa rodar pelas vias próximas. Contudo, a medida talvez possa não surtir efeito, devido à falta de espaços para deixar os carros nas ruas. A alternativa é utilizar três estacionamentos privados (um deles, de um hipermercado) localizados no entorno do hospital.
FONTE A TRIBUNA
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